Bienal de São Paulo vai valorizar a experiência individual do espectador.

De 7 de setembro a 9 de dezembro.

Cartaz desenhado por Raul Loureiro para a 33ª Bienal de São Paulo. © Arp, Jean / AUTVIS, Brasil, 2017. Divulgação.

A 33ª Bienal de São Paulo – Afinidades Afetivas acontece de 7 de setembro a 9 de dezembro no Pavilhão Ciccillo Matarazzo (Parque Ibirapuera). Gabriel Pérez-Barreiro selecionou os projetos individuais que irão compor a exposição ao lado de mostras coletivas organizadas por sete artistas-curadores.

O tema Afinidades Afetivas é inspirado pelo romance Afinidades eletivas (1809), de Johann Wolfgang von Goethe, e pela tese “Da natureza afetiva da forma na obra de arte” (1949), de Mário Pedrosa. A ideia é valorizar a experiência individual do espectador na apreciação das obras em vez de um recorte curatorial que condiciona uma compreensão pré-estabelecida. O título não serve como direcionamento temático para a exposição, mas caracteriza a forma de conceber a mostra a partir de vínculos, afinidades artísticas e culturais entre os artistas envolvidos. Como no texto de Mário Pedrosa, há uma proposta de investigação das formas pelas quais a arte cria um ambiente de relação e comunicação, passando do artista para o objeto e para o observador. Presença, atenção e influência do meio são as premissas que norteiam a curadoria desta edição, numa reação a um mundo de verdades prontas, no qual a fragmentação da informação e a dificuldade de concentração levam à alienação e à passividade.

Com esse pano de fundo, a 33ª Bienal de São Paulo será composta pela soma de projetos individuais selecionados por Gabriel Pérez-Barreiro a sete mostras coletivas concebidas pelos artistas-curadores já anunciados: Alejandro Cesarco (Montevidéu, Uruguai, 1975); Antonio Ballester Moreno (Madri, Espanha, 1977); Claudia Fontes (Buenos Aires, Argentina, 1964); Mamma Andersson (Luleå, Suécia, 1962); Sofia Borges (Ribeirão Preto, Brasil, 1984); Waltercio Caldas (Rio de Janeiro, Brasil, 1946) e Wura-Natasha Ogunji (St. Louis, EUA, 1970). Suas proposições curatoriais serão detalhadas em breve.

A seleção de Gabriel Pérez-Barreiro traz projetos comissionados de oito artistas (Alejandro Corujeira, Bruno Moreschi, Denise Milan, Luiza Crosman, Maria Laet, Nelson Felix, Tamar Guimarães, Vânia Mignone), uma série icônica de Siron Franco e homenagens a três artistas falecidos: o guatemalteco Aníbal López, o paraguaio Feliciano Centurión e a brasileira Lucia Nogueira.

Visto que Pérez-Barreiro propõe um modelo curatorial que evita aproximações temáticas, mais do que questões de linguagem ou conceituais, os três artistas homenageados têm em comum a atuação durante os anos 1990 e o fato de terem falecido precocemente. “Essa foi a primeira geração latino-americana a fazer uma arte livre da opressão dos regimes totalitários das décadas anteriores”, explica Pérez-Barreiro. São obras isentas da necessidade de trabalhar de maneira codificada ou oculta, passando a uma maior ênfase na expressão da subjetividade como ato político.

De acordo com Pérez-Barreiro, a homenagem a esses três artistas, com cerca de 30 a 40 obras de destaque dentro da trajetória de cada um deles, foi uma maneira de repensar os chamados núcleos históricos da Bienal de São Paulo, que marcaram a exposição até sua 26ª edição (2004) e que ele considera uma peculiaridade positiva em relação às outras exposições sazonais ao redor do mundo. “Eu queria artistas que fossem históricos, mas ao mesmo tempo não consagrados, ou seja, que esses núcleos não fossem apenas a reiteração de nomes que já conhecemos. Os artistas homenageados são pouco conhecidos na América Latina, mas são expoentes de sua geração, então trazê-los à Bienal é uma forma de resgatá-los do desaparecimento da história da arte e mostrá-los para as novas gerações”, diz Pérez-Barreiro. Para o curador, a realização dessas exposições também significa uma contribuição expressiva da Fundação Bienal na pesquisa, catalogação e recuperação dos acervos desses artistas.

Aníbal López (Cidade da Guatemala, Guatemala, 1964-2014), também conhecido por A-153167, o número de sua cédula de identidade, foi um dos precursores da performance em seu país. Sua obra, que inclui vídeo, performance, live act e intervenções urbanas, entre outras formas de expressão, tem forte caráter político e se volta para questões de disputas entre fronteiras nacionais, culturas indígenas, abusos militares e até do mercado de arte. Registros em vídeo e fotografias de ações efêmeras, realizadas como forma de protesto à objetificação e fetichização da arte, compõem a mostra.

O universo queer é abordado com delicadeza por Feliciano Centurión (San Ignacio, Paraguai, 1962 – Buenos Aires, Argentina, 1996), que deixou seu país natal, o Paraguai, para radicar-se na Argentina, onde se tornou expoente da chamada geração “Rojas” (primeiros artistas a expor na galeria do Centro Cultural Rector Ricardo Rojas, da Universidad de Buenos Aires) até ser vitimado por complicações decorrentes da AIDS, aos 34 anos. Centurión trabalhava primordialmente com tecidos e bordados, incorporando peças como lenços e crochês comprados em feirinhas portenhas. Descendente de uma família de bordadeiras, ele se apropria de práticas artesanais como linguagem artística para expressar elementos de sua história pessoal a partir de uma tradição familiar comum na cultura paraguaia.

Ainda pouco conhecida no Brasil, a goiana Lucia Nogueira (Goiânia, Brasil, 1950 – Londres, Reino Unido, 1998) é uma figura essencial para compreender a arte britânica do período e desenvolveu uma carreira internacionalmente reconhecida. Suas esculturas e instalações, foco da individual incluída na 33ª Bienal, subvertem o utilitarismo de objetos com um humor sutil, tanto pela associação inusitada entre elementos quanto pelo jogo semântico constantemente presente em seus títulos, criando uma atmosfera de estranheza e poesia.

Projetos individuais de nove artistas, dos quais oito foram especialmente comissionados, completam a seleção de Pérez-Barreiro. O único a exibir um trabalho histórico é Siron Franco (Goiás Velho, Brasil, 1950), com a série de pinturas Césio/Rua 57. Nela, Franco eterniza a impressão de horror e isolamento causada pelo acidente radioativo acontecido em 1987 no Bairro Popular, em Goiânia, com o elemento Césio 137. Nascido e criado naquele bairro, o artista retornou à sua cidade natal logo após o acidente, na contramão da população local, deixando definitivamente o eixo Rio-São Paulo. Seus registros da catástrofe ambiental marcaram uma guinada em sua carreira, antes de temática irônica, para uma alegoria da catástrofe através de elementos simbólicos.

O pigmento de algumas pinturas da série advém da terra de Goiânia, que muitos acreditavam estar contaminada pela substância radioativa. Roupas inseridas em algumas das telas relembram as quatro primeiras vítimas do acidente, dentre as quais uma criança. Em tempos de desastres ambientais como o rompimento em 2015 da barragem de Fundão, em Mariana, o debate levantado pela obra de Siron Franco permanece tristemente atual.

Os oito artistas com projetos comissionados têm em comum o desenvolvimento de trabalhos que não se encaixam numa estrutura temática. “São pesquisas complexas que funcionam individualmente e não precisam de um contexto adicional para que o espectador se relacione com os trabalhos”, explica Pérez-Barreiro.

O portenho Alejandro Corujeira (Buenos Aires, Argentina, 1961) possui uma concepção formal leve e fluida, que parece querer captar o movimento da natureza. Ele terá esculturas e pinturas apresentadas na mostra. Denise Milan (São Paulo, Brasil, 1954) cria esculturas e instalações com grandes pedras e cristais. Na 33ª Bienal, a artista exibirá novos trabalhos nesses formatos.

O cotidiano serve de inspiração às obras de Maria Laet (Rio de Janeiro, Brasil, 1982), que exibirá um novo vídeo na 33a Bienal, e de Vânia Mignone (Campinas, Brasil, 1967), que trará pinturas inéditas. Nelson Felix (Rio de Janeiro, Brasil, 1954), que em seu “trabalho formal parece materializar uma consciência planetária”, nas palavras de Pérez-Barreiro, mostrará uma nova instalação escultórica.

As pesquisas de Bruno Moreschi (Maringá, Brasil, 1982) e Luiza Crosman (Rio de Janeiro, Brasil, 1987) se relacionam com a corrente da crítica institucional e fogem de suportes artísticos tradicionais. “Com esses artistas teremos, dentro da exposição, um olhar crítico sobre como a arte funciona, é exibida e justificada”, afirma Pérez-Barreiro. Partindo de uma abordagem pessoal e poética, Tamar Guimarães (Viçosa, Brasil, 1967), que une uma abordagem crítica sobre as instituições a preocupações poéticas e narrativas, apresentará um novo vídeo.

Junto com a divulgação dos nomes selecionados por Gabriel Pérez-Barreiro, a 33ª Bienal lança o cartaz desta edição, projetado por Raul Loureiro, que utilizou suas afinidades como motivos gráficos para a comunicação visual da mostra. O cartaz da exposição é constituído da reprodução da obra Formas expressivas (1932), de Hans (Jean) Arp, uma pintura com madeira em relevo, acompanhada por elementos tipográficos. A identidade visual adota a família tipográfica Helvetica, que prioriza a clareza e a neutralidade de significados, e enfatiza o número 33 como elemento de sua concepção.

A 33ª Bienal apresenta ainda sua publicação educativa, elaborada pela equipe da Fundação Bienal com consultoria de Lilian L’Abbate Kelian e Helena Freire Weffort. Sob o título Convite à atenção, a publicação parte de uma discussão acerca da atenção para propor atividades distintas, que podem ser realizadas individualmente ou em grupos. Procurando contrabalançar a dispersão causada pelo imenso volume de informação e imagens a que somos submetidos diariamente, foram criados exercícios que configuram um convite a estar atento à experiência com a arte. A peça, com colagens inéditas feitas pelo artista-curador Antonio Ballester Moreno, propõe um conjunto de experiências cujo uso não está restrito à 33ª Bienal, mas a diversas obras e contextos.

Serviço: 33ª Bienal de São Paulo – Afinidades afetivas
Data: De 7 de setembro a 9 de dezembro
Local: Pavilhão Ciccillo Matarazzo, Parque Ibirapuera.