A FAAP traz a mostra “Brasília – A Ideia de uma Capital. A Legislação e o Debate Parlamentar” em maio.

A FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado) abre mais uma grande mostra em Brasília neste mês. Com abertura prevista para o dia 18 de maio, a exposição intitulada Brasília – A Ideia de uma Capital. A Legislação e o Debate Parlamentar, com curadoria de Casimiro Neto, Danilo Macedo,  José Theodoro Menck e Ricardo Oriá tem como escopo analisar a construção da ideia de uma capital para o país, ressaltando o papel do Poder Legislativo na discussão de propostas e na elaboração de projetos com essa finalidade.
 
Frei Vicente do Salvador, considerado nosso primeiro historiador, já fazia críticas ao processo de colonização dos portugueses, ao afirmar que “sendo grandes conquistadores de terras, não se aproveitam delas, mas contentam-se de as andar arranhando ao longo do mar como caranguejos” (História do Brasil, 1627). Havia, pois, a necessidade de ocupar o território de dimensões continentais e isso implicava a interiorização da metrópole portuguesa.
 
No século XVIII, os inconfidentes mineiros propunham, no bojo desse movimento emancipacionista, a transferência da capital para a cidade de São João del Rei (1789). Como sabemos, o movimento fracassou, mas a ideia de interiorização da sede do governo não. Ela é retomada pelo jornalista Hipólito José da Costa que, à frente do jornal Correio Braziliense, propõe a mudança da capital para as proximidades do rio São Francisco (1813).
 
Na verdade, conforme veremos no decorrer desta exposição, houve várias propostas para a transferência da capital do Rio de Janeiro para o interior do país em diferentes momentos históricos. Nesse processo, vale ressaltar, o Poder Legislativo teve um papel de destaque, muitas vezes relegado ao esquecimento por parte da historiografia oficial brasileira, que elegeu o Poder Executivo como artífice único nas teses de interiorização da capital do país.
 
Pode-se dizer que a primeira proposta parlamentar de mudança da capital foi a de José Bonifácio de Andrada e Silva, quando redigiu documento aos deputados paulistas que participaram das Cortes de Lisboa (1821). Essa proposta foi retomada por ocasião dos debates de nossa primeira Assembleia Constituinte, realizada em 1823. Bonifácio sugeriu Petrópolis ou Brasília como nome para a nova capital. Segundo ele, a mudança justificava-se, pois a cidade do Rio de Janeiro não oferecia segurança, uma vez que, desde o século XVIII, vinha sendo alvo constante de invasões, saques e pilhagens de corsários franceses. Havia também, por parte das elites locais, uma espécie de “medo da onda negra”, que se manifestaria por meio de um possível levante ou motim, uma vez que a população do Rio de Janeiro era composta majoritariamente por negros e mestiços (correspondiam a cerca de 2/3 da população). Nossa primeira Assembleia Constituinte foi dissolvida e a Constituição de 1824, outorgada pelo imperador D. Pedro I, não incorporou essa tese da interiorização da capital.
 
Vários parlamentares elaboraram proposições legislativas tendo como objetivo a mudança do centro decisório do poder. Destaque especial é dado ao primeiro projeto de lei de transferência da capital, apresentado na Câmara dos Deputados em 1831, de autoria do deputado paraense João Cândido de Deus e Silva. Não podemos também deixar de mencionar o trabalho do historiador e diplomata Francisco Adolfo de Varnhagen que, a exemplo dos viajantes estrangeiros em suas expedições Brasil adentro, visitou o Planalto Central com o objetivo de encontrar um sítio adequado para a construção da nova capital, a qual propôs o nome de Imperatória.
 
Com a implantação da República, a mudança da capital ganhou força constitucional, por meio da Carta Magna de 1891. As constituições posteriores (1934 e 1946) trazem em seu texto a vontade política de transferência da capital para o interior do país, com exceção da Constituição de 1937, fruto do golpe impetrado por Getúlio Vargas, que inaugurou o chamado Estado Novo (1937-1945). Esse período representou o maior recesso parlamentar forçado de nossa história política.
 
Mesmo com o Estado Novo, a mudança da capital foi pensada no contexto da chamada Marcha para o Oeste, cujo principal ideólogo foi o escritor Cassiano Ricardo, que, em obra homônima (1942), colocou a transferência da capital como extensão do movimento bandeirante ocorrido nos séculos XVII e XVIII.
 
Com a queda de Vargas e a redemocratização do país, a Constituição de 1946 retomou a ideia de mudança da capital, que ganhou força no contexto do projeto nacional-desenvolvimentista do presidente Juscelino Kubitschek, apesar de inúmeras resistências por parte da imprensa e de Parlamentares da União Democrática Nacional (UDN) que faziam oposição sistemática ao governo.
 
Em 1956, a Mensagem de Anápolis, que dispôs sobre a mudança da capital federal, e o projeto de lei n. 1.773/1956, de autoria do deputado Emival Caiado e que fixava a data de mudança da capital para o dia 21 de abril de 1960, ratificaram a transferência do Rio de Janeiro para Brasília, consolidando o processo de interiorização do núcleo decisório do poder.
 
A escolha da data de inauguração de Brasília (21 de abril) reveste-se de simbolismo histórico, unindo o presente ao passado, ao reforçar o ideário republicano em torno da figura de Tiradentes – nosso herói nacional por excelência – e a ideia de mudança da capital presente na proposta dos inconfidentes mineiros.
 
No decorrer da exposição, é dada ênfase às diferentes sedes do Poder Legislativo, através de fotos, desenhos, maquetes e plantas, com a finalidade precípua de salientar o lócus histórico em que se deu o debate parlamentar das propostas de mudança da capital. Com a construção de Brasília, pela primeira vez em nossa história política, teremos uma única sede para as duas Casas Legislativas. O Palácio do Congresso Nacional dá a correta dimensão do bicameralismo brasileiro, além de expressar a beleza arquitetônica projetada por Oscar Niemeyer, em um dos poucos edifícios tombados pelo governo federal em Brasília que integram o patrimônio histórico e artístico nacional.
 
Essa exposição se insere nas comemorações alusivas ao cinquentenário de Brasília e à transferência da Câmara dos Deputados para o Planalto Central, após 137 anos de funcionamento no Rio de Janeiro. Consideramos que a comemoração de efemérides, sobretudo as de cunho histórico, propicia o resgate de nossa memória como instrumento de afirmação da identidade nacional, ao mesmo tempo em que possibilita analisar criticamente o passado como meio para melhor se compreender o presente e projetar um Brasil mais justo e solidário para as atuais e as futuras gerações.