Festa Afro-Literária online mira na Literatura Quilombola entre a tradição e o afrofuturismo

Luedji Luna. Foto: Helen Salomão.

De um encontro fortuito na praça de Cavalcante (GO) nasceu uma proposta inovadora em formato e conteúdo, a Festa Afro-Literária. Com caráter emancipador e amplificador dos diálogos sobre a escrita negra, será realizada de 3 a 7 de novembro, em versão totalmente online, mas sem perder as raízes fincadas na comunidade quilombola dos Kalungas.

Ellen Oléria. Foto: Diego Bresani.

O evento reúne grandes nomes do cenário literário e artístico negro como Elisa Lucinda, Ryane Leão, Luedji Luna, Ellen Oléria, além de representantes locais, como Bia Kalunga, Malu Martins e Wanderléia Kalunga. Para assistir à programação, basta se inscrever no canal da festa no Youtube.

Elisa Lucinha. Foto: Jonathan Estrella.

Com a narrativa Literatura Quilombola: entre a tradição e o afrofuturismo, a festa conta com oficinas, rodas de conversa e apresentações artísticas. Fazem parte da programação: curso de formação de público, de escrita, estudos percussivos enquanto linguagem e lançamento de publicações independentes.

Sempre com o objetivo de estimular a troca e compartilhamento de saberes com as comunidades locais de Cavalcante.
Calila das Mercês, escritora, doutora em Literatura e uma das coordenadoras da Festa, destaca a necessidade de estabelecer diálogos no meio da Literatura Negra.

Grupo Flores e Frutos do Quilombo.

“Percebemos as pontes e as diferenças que temos em todos os espaços que transitamos, e que existe uma necessidade aqui no centro-oeste de dialogarmos com mais ênfase sobre a arte literária negra, já que é um dos pilares de construção social de imaginários. Queremos refletir sobre a tradição e o afrofuturismo, considerando as literaturas quilombolas e negras plurais, e promovendo encontros, partilhas de e entre artistas e pesquisadoras/es negres dos tantos brasis existentes”, diz.

Para Edymara Diniz, nascida e criada em Cavalcante, mestre em Artes Cênicas e também idealizadora do evento, a Festa nasceu com o intuito de ampliar o conhecimento da comunidade local e dos quilombolas Kalungas do município de Cavalcante. “Queremos possibilitar o acesso das pessoas desse quilombo às diversas literaturas negras e outras referências de artistas negros engajados nessa área de conhecimento”, explica.
Edymara e Calila se conheceram em um evento realizado por Edymara na cidade de Cavalcante, na Mostra de Teatro Afro Cena. Depois de discutirem interesses e visões comuns no sentido de visibilizar discursos e ideias, pensaram na Festa Afro-Literária, um evento que propõe uma interlocução horizontal entre autores consagrados nacionalmente e pessoas da comunidade de Cavalcante, sempre com o objetivo de destacar e amplificar a produção cultural negra. As duas assinam a idealização, curadoria e realização do evento. “Propostas como essa inserem mais uma possibilidade de ampliação de espaços de diálogos e escuta, em que as pessoas negras tenham o protagonismo devido em vez de figurarem a exceção que confirma a regra. Na maioria dos eventos literários não estamos presentes em quantidade proporcional da representação da sociedade brasileira”, completa Calila.

Contém Dendê.

Uma das iniciativas que já saiu do papel foi a seleção de 15 jovens da comunidade local para capacitação em um minicurso em Produção Cultural, ministrado por Edymara Diniz com participação de Bárbara Barbosa, especialista em acessibilidade cultural. Os jovens ganharam bolsas e certificação. “A proposta é que a comunidade quilombola local se aproprie dos meios de produção do evento, tanto a seleção de estagiários como a realização do minicurso em produção cultural visam a formação de multiplicadores em produção cultural e do evento.”

Entre os temas das rodas de conversa estão “Infância e Literatura: o papel das referências negras na construção das identidades da primeira infância”, com Cássia Vale, Cristiane Sobral, Ayana Sobral (mediação Wanderléia Kalunga); “Vozes negras na Literatura: recitar é viver”, com Denise Correia e Fábio Santana (mediação: Malu Martins); “Entre vãos e rios das escritoras quilombolas: pluralidade de vozes-mulheres”, com Nilça Kalunga e Eurotildes dos Santos Rosa (mediação: Victor Hugo).

Ryane Leão.

Já na parte educativa, o evento oferece oficinas em tempo real, pela plataforma Zoom, como “Escrevivências artesanais”, com Tatiana Nascimento; “Movimentos negros no Goiás”, com Janira Sodré e “Escrita criativa”, com Cristiane Sobral.

A programação diversificada e a presença de diversas abordagens artísticas e literárias fazem da Festa Afro-Literária um evento único em formato e proposta, mas que carrega a intenção de discutir questões universais e pluriversais. “A formulação de imaginários sociais perpassa a ambiência da literatura, da mídia, e isto influência nas abordagens e vivências cotidianas. Observar quem faz as críticas literárias, as grandes editoras do país, as pesquisas acadêmicas legitimadas… Oferecer debates e estudos sobre e de negritudes para o viés literário é mais um compromisso de combater o projeto de embranquecimento dos espaços político-sociais, as tentativas de objetificação e de redução das epistemes negras em relação ao que foi e ainda é imposto como norma”, ressalta Calila das Mercês.

O projeto da Festa Afro-Literária foi aprovado nos editais do Fundo de Arte e Cultura do Estado de Goiás de 2018. Toda a programação é gratuita e conta com tradução e interpretação em libras realizada pelas intérpretes, Bárbara Barbosa e Daniela Salazar.

Festa Afro-Literária
De 3 a 7 de novembro
Classificação: Livre
Youtube: https://bit.ly/festaafroliteraria
Programação completa: www.linktr.ee/afroliterariacvc