Risos lavados com sangue.

Foto: Renato Acha.

Jansler Aragão

A estreia de I Pagliacci, de Ruggero Leoncavalo, ontem (17 de junho) no 1º Festival de Ópera de Brasília coroou com êxito a primeira ópera do programa, após o sucesso do Réquiem de Mozart, no concerto de abertura, no dia 7 de junho. O sucesso reitera a trajetória bem sucedida da obra desde sua estréia em 21 de maio de 1892, em Milão, na época, sob direção de Arturo Toscanini.

A releitura leve, colorida e dramática feita por Francisco Mayrink (Direção de Cena) e Theodoro Cochrane (Figurino) contextualiza o universo circense do texto, em um cenário de uma cidadezinha do interior goiano, nos anos 50.  A escolha pelo figurino vintage foi feliz, pois além de dar leveza e bom humor ao contexto cênico da performance, não comprometeu a inserção natural de acrobatas, pernas de pau e dos personagens do circo, ao mesmo tempo em que rompeu com a expectativa da platéia de ver um figurino típico do século XIX, comumente empregado  em outras performances do gênero.

Foto: Renato Acha.

A vida reproduz a arte, o palco se confunde com a realidade onde a honra é lavada com sangue. A inspiração do libreto originalmente tem suas origens em uma história real, contada pelo pai de Leoncavalo, sobre um ator que mata sua esposa por ciúmes. A identificação imediata do público talvez se explique pelo fato do crime passional  ter forte ressonância no imaginário popular de todos os tempos.

Este elemento quase arquetípico ganha nuances interessantes pelo fato de ser uma tragédia movida por um palhaço, um símbolo da comédia, da inocência infantil, ao mesmo tempo em que a esposa traidora, o amante e o rival do amante são membros do mesmo grupo circense, o que torna tensa a convivência entre atores e personagens, que se alternam na curiosa interpretação de uma cena cômica de traição que se repete vis à vis na vida real.

Foto: Renato Acha.

A regência de Emílio de César garantiu um desempenho muito satisfatório da Orquestra do Teatro Nacional Claudio Santoro – OSTNCS, que se harmonizou com a interpretação dos solistas, com destaques para o tenor Juremir Vieira, no papel de Canio, o Pierrot; a soprano Gandhia Brandão, como Nedda, a Colombina, o barítino Leonardo Páscoa, como Tonio e Taddeo; o baixo Hermógenes Correia, como Sílvio e o tenor Roney Calazans, como Beppe, o Arlequim. O Coro do Festival de Ópera de Brasília e o Coro Lírico de Brasília Instituto Educarte, sob a direção da Maestrina Rita Conte, surpreenderam o público com uma interpretação cativante, sem prejuízo da clareza na pronúncia do texto, afinação, precisão rítmica e harmonia das vozes. A platéia pôde ainda se beneficiar com a exibição simultânea de legenda, que enriqueceu as informações contidas no libreto.

A performance deste sábado (18 de junho) às 20 horas, também sob a regência do maestro Emílio de César,  promete repetir o sucesso da estréia, com Hélenes Lopes, como Canio, o Pierrot; Érika Kallina, como Nedda, a Colombina; Tobias Hagge, como Tonio/Taddeo; Marlon Maia, como Sílvio e Roney Calazans, como Beppe, o Arlequim. A entrada é franca.

Foto: Renato Acha.
Hamilton Pereira (Secretário de Cultura do DF), Marília Gabriela e Theodoro Cochrane (Figurino). Foto: Renato Acha.