Quem não gosta de piscina no calor? Agora uma piscina em uma exposição é ainda mais fascinante. Será que ela tem água mesmo? É o que vamos descobrir na instalação que vai ocupar o Pavilhão de Vidro do CCBB de 21 de janeiro a 23 de abril com entrada franca.
A grande exposição do artista argentino ainda vai apresentar um elevador de fundo infinito, janelas para jardins imaginários e uma sala de aula “abandonada”. Tratam-se de obras provocadoras que conquistam o público de todas as idades com forte apelo popular.
Com um nome bastante explícito – A tensão, revela um dos prováveis sentimentos que os visitantes sentirão diante das instalações do artista. Isso porque Erlich trabalha com referências que são, literalmente, “lugares- comuns”, espaços que estamos acostumados a ver no dia a dia, mas deslocados da condição de normalidade. Como afirma o curador da exposição, Marcello Dantas, “a obra de Leandro Erlich é estruturada no mecanismo da dúvida. O que nossos olhos veem está em desacordo com o que nossa mente conhece”, sintetiza.
Nascido em 1973 e produzindo suas obras em seus ateliês em Buenos Aires e Montevidéu, está constantemente rompendo as fronteiras que normalmente acreditamos existir entre a realidade e a ilusão. “Estou interessado principalmente em transformar elementos que as pessoas acreditam que não podem ser transformados, que não podem ser diferentes. Trata-se de uma utopia de apresentar a possibilidade de transformar o que existe em uma outra coisa, e essa ação nos convida a imaginar a realidade de uma maneira diferente”.
Uma das mais bem sucedidas experiências nesse sentido – que se tornou uma de suas obras mais populares e desconcertantes – é a “Swimming Pool” (piscina, em português), que será instalada no pavilhão de vidro do CCBB Brasília. Atração onde quer que seja exposta, a piscina de Erlich provoca sensações absurdas tanto por quem entra nela – sem se molhar – quanto para quem está do lado de fora: uma camada de água entre um lado e outro cria a ilusão de que as pessoas ao fundo estão de fato mergulhadas numa piscina em que não precisam respirar.
Outra obra de grande destaque entre as instalações de Erlich presente na exposição de Brasília é “Classroom”. Nela, quando o visitante adentra na sala, sua imagem é refletida num vidro, como se ele fizesse parte de uma cena diferente. Quem adentra a sala fica parecido com uma espécie de fantasma, como se estivesse numa sala de aula abandonada – as memórias de infância se projetam para um cenário de crise e de abandono. Em diferentes trabalhos, Erlich recorre à ideia de recorte visual sugerida pelas janelas.
Um desses trabalhos, que será exposto em Brasília, se chama, justamente, “Blind Window”. “O que guarda a memória? Nosso cérebro ou nossos olhos?”, perguntou o artista, de forma retórica, durante uma entrevista no Japão. “Gosto da ideia de pensar que o olho, ou o vidro, também são capazes de guardar histórias”. É justamente essa a proposta de Erlich ao fixar paisagens, situações imaginárias e inusitadas, em objetos arquitetônicos ou decorativos, como uma janela ou um falso espelho num elevador.
Erlich participou de algumas grandes exposições no Brasil. Em 1997, integrou o rol de artistas que estiveram na 1ª Bienal do Mercosul e, em 2004, figurou entre os nomes da 26ª Bienal de São Paulo. Em 2001, representou a Argentina na 49ª Bienal de Veneza, onde voltou a estar em 2005. São, também, dezenas as grandes exposições coletivas em que Erlich esteve, assim como são dezenas as exposições individuais de Erlich pelo mundo: New York, Barcelona, Londres, Seul, Paris, Buenos Aires: onde quer que seja exposta, a arte de Leandro Erlich provoca o público.
Num texto de 2021 publicado em seu blog, o especialista em arte latino-americana Hans Herzog associou o trabalho de Erlich ao trompe-l’oeils de Escher, por provocarem espanto e surpresa e por serem “levemente sinistros”. E cita o crítico Rodrigo Alonso, que num texto de 2014 defendeu que a obra do argentino rompe com os automatismos do nosso mundo, ao “desafiar a gravidade, inverter os espaços, enganar o olhar”, entre outras estratégias de construção de verossimilhança e de potencialização do insólito.
Ao deslocar o conhecimento prévio do espectador daquilo que poderíamos chamar, agora recorrendo a um lugar-comum da linguagem, de “zona de conforto”, Erlich coloca o expectador necessariamente em confronto com o que dizia sua experiência sobre dada situação, exigindo “um engajamento e uma atenção participativa para desvendar cada obra”, explica o curador Marcello Dantas: “cada situação só se materializa com a presença do público, em que a obra abre um espaço de acontecimento. O título da exposição já conclama essa dúvida: pede-se atenção ao mesmo tempo em que carrega em si o mistério provocado pela tensão que existe no espaço vazio antes da participação”, completa.
As ilusões óticas e a subversão da realidade propostas por Erlich fazem dele um artista, simultaneamente, conceitual e tremendamente popular. A exposição “Ver e crer”, no Museu Mori de Tokio, aberta no fim de 2017, atraiu 400 mil espectadores pagantes nos três primeiros meses, superando a bilheteria alcançada pelo japonês Takashi Murakami (315 mil ingressos) e se aproximando do resultado obtido pelo Ai Weiwei (460 mil) no mesmo período. À época, o museu destacou o interesse que a obra do argentino provocava entre os jovens e adolescentes, que representavam cerca de metade dos visitantes.
Além de provocar o olhar destes visitantes em particular, as obras de Erlich convidam à interação nas redes sociais: o Instagram ficou cheio de fotos de jovens integrados ao espaço expositivo e esse foi um dos motores, também, do sucesso de público. Em 2018, ao transformar o teto de uma enorme loja de departamentos de Paris em céu artificial, foi chamado pela imprensa, positivamente, de “manipulador do real” e de “o mágico da arte”. A reputação se manteve quando expôs no Museu de Arte Latino- americana de Buenos Aires (Malba), em 2015, fazendo “desaparecer” um pedaço de um grande obelisco da capital argentina enquanto uma réplica da ponta do monumento era exibida na porta do museu.
Desse modo, a tensão provocada pelo artista é resultado não apenas de uma percepção aguda das possibilidades visuais de uma dada situação, mas também de uma preocupação com o próprio espaço que abriga as mostras, que se tornam, desse modo, únicas. A percepção da piscina em Brasília, no Pavilhão de Vidro, será bastante diferente da provocada pela instalação no Malba, de Buenos Aires, por exemplo.
Justamente por dialogar com o entorno e com as experiências prévias dos visitantes, o trabalho de Leandro Erlich expressa como poucos nossa época. Como explica Marcello Dantas, essa é também uma sensação progressiva: “A cada etapa dessa viagem pela exposição, nos damos conta da relação entre expectativa, tensão e atenção que traduzem o espírito de um tempo de incertezas”.
Durante o projeto, o Programa CCBB Educativo oferece uma série de atividades interativas, educacionais e didáticas para as crianças, com o objetivo de levar a esse público um pouco de conhecimento, informação e cultura relacionado ao tema da exposição. A programação inclui desde atividades de música e pintura a contação de histórias. A programação completa pode ser conferida no site bb.com.br/cultura. Escolas, grupos ou instituições podem agendar visitas guiadas às galerias e espaços expositivos durante a semana pelo e-mail: agendamento.df@ccbbeducativo.com.
“A tensão” de Leandro Erlich
De 21 de janeiro a 23 de abril de 2023
Terça a domingo, das 9h às 20h30
CCBB Brasília (SCES, Trecho 2)
Entrada gratuita, com retirada de ingresso no site bb.com.br/cultura
Classificação indicativa: Livre.