Intervenção com restos de automóveis reflete sobre o avesso da utopia da capital.

Até 2 de abril.

Fotos: Ismael Monticelli.

A intervenção Monumento ocupa a Marquise do Complexo Cultural Funarte (Eixo Monumental) até 2 de abril. Os artistas visuais Adriano Guimarães (DF), Fernando Guimarães (DF) e Ismael Monticelli (RS) criaram uma espécie de jardim feito de restos de automóveis, além de elementos que evocam o desenho da paisagem da cidade. A abertura ocorre na quarta (15 de fevereiro) às 17 horas. O site specific, obra elaborada especialmente para o local, aborda a modernidade e seus ideais de progresso, velocidade e dinamismo, bem como a criação de Brasília e o desenvolvimento da indústria automobilística no País.

Com acompanhamento crítico das curadoras Daniela Name (RJ) e Marília Panitz (DF), “Monumento” foi concebido pelos três artistas que se encontram regularmente para realizar trabalhos em conjunto. Contemplado no Prêmio de Arte Contemporânea 2015 – Atos Visuais Funarte Brasília, o trabalho apropria-se do significado corriqueiro da palavra monumento – construção com finalidade de perpetuar a memória de pessoa ou acontecimento relevante na história de uma comunidade, nação e etc. – e da sua intrínseca relação com Brasília, a cidade dos monumentos. A obra utiliza como matéria prima restos de veículos acidentados, enfocando uma estratégia, ética e estética, recorrente na poética dos três artistas, que diz respeito à valorização do que habitualmente é considerado desimportante ou desprezado pelo senso comum.

Se Brasília é a cidade-síntese de nossa modernidade como uma espécie de ruína de futuro, talvez o carro seja o maior vestígio dessa ruína. A indústria automobilística foi uma das principais plataformas do programa de governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), não apenas no que diz respeito à economia e à política, mas também à imagem de Brasil idealizada durante esse período. O veículo – literal e metafórico – pode nos transportar para a reelaboração dessa história. Ao utilizar o carro acidentado como escultura do acaso, a intervenção propõe uma reflexão crítica sobre o fluxo que se tornou invisível, por ser tão naturalizado: produção em massa -> distribuição acelerada -> descarte. Talvez, ao relocar esses restos abandonados, repletos de narrativas, estes possam adquirir visibilidade ao revelar o avesso de uma utopia. “Adriano, Fernando e Ismael estão lidando com um anticarro e transformando estes restos de velocidade em jardim. Lampejo de poesia”, afirma a curadora Daniela Name.

Direcionando o olhar para Brasília – lugar onde ideologia, interesses econômicos e arquitetura estão imbricados desde a sua concepção –, “Monumento” é feito dessas inversões e também de muitas condensações – da história de Brasília, da história da arte moderna, da história dos próprios artistas envolvidos. “Eu vejo nessa intervenção lastros de trabalhos que os três fizeram juntos e separados. Ao criarem seu próprio eixo com esses desastres, é como se eles investissem, mais uma vez, na necessidade de paralisia, de silêncio e de contemplação para redesenhar metas e mapas. Menos veloz e mais opaca, essa jornada talvez seja a única cartografia possível em meio aos destroços”, completa Name.

Para Marília Panitz, criar uma intervenção que coloca o carro desincorporado de sua funcionalidade, os artistas fustigam a ideia de retomar um devir que nasceu fadado ao descarte. “Monumento” se organiza no espaço externo, em um jardim, constituindo um desenho de instalação a partir dos jardins japoneses. Estes carregam a ideia de morte, não como saudade ou memória, mas como forma de contemplação sobre a existência. Para Panitz, esta é uma experiência estética de lidar com a ausência, que deve ser observada e sentida. “Não existem detalhes a observar e apreender, e sim outro tempo de visão que se permitir. Essa tensão é o que dá à obra o critério de monumento: Um estar para refletir”, sentencia.

O projeto oferecerá ao público duas oficinas sobre questões relacionadas ao trabalho, além de contar com o lançamento de um catálogo ao fim da exposição, juntamente com uma conversa, seguida de visita à obra, conduzida por Marília Panitz e pelos artistas.

Serviço: Monumento – Intervenção realizada por Adriano Guimarães, Fernando Guimarães e Ismael Monticelli.
Local: Marquise/Entorno (Complexo Cultural Funarte – Eixo Monumental, Setor de Divulgação Cultural – Entre a Torre de TV e o Centro de Convenções)
Abertura: 15 de fevereiro (quarta) às 17 horas
Visitação: De 16 de fevereiro a 2 de abril, de terça a domingo, de 10 às 21 horas
Entrada franca
Classificação indicativa: Livre
Informações: (61) 3322-2076 e 3322-2029
www.funarte.gov.br